Se Deus existe é eterno, ativo e necessário.
Eterno? — É-o por definição. É a sua razão de ser. Não se pode conceber que ele esteja enclausurado nos limites do tempo. Não se pode imaginar como tendo tido começo e venha a ter fim. Não pode haver aparição e desaparição. É de sempre.
Ativo? — É, e não pode deixar de ser. Segundo os religiosos, foi sua atividade que engendrou tudo quanto existe, como foi a sua atividade que se afirmou pelo gesto mais colossal e majestoso que imaginar se pode: a criação dos mundos.
Necessário? — É-o e não pode deixar de ser, visto que sem a sua vontade, nada existiria: ele é o autor de todas as coisas, o ponto inicial de onde saiu tudo, a fonte única e primeira de onde tudo emanou. Bastando-se a si próprio, dependeu de sua vontade que tudo fosse tudo ou que fosse nada.
Ele é, portanto: eterno, ativo e necessário.
Mas eu pretendo e vou demonstrar que se Deus é eterno, ativo e necessário, também deve ser eternamente ativo, e eternamente necessário. E que, por consequência, ele não pôde, em nenhum momento, ter sido inativo ou inútil, e que enfim, ele jamais criou.
Negar que Deus seja eternamente ativo equivale o dizer que nem sempre o foi, que chegou a sê-lo, que começou a ser ativo, que antes de o ser não o era. Dizer que foi pela criação que ele manifestou a sua atividade é admitir, ao mesmo tempo, que por milhares e milhares de séculos que antecederam a ação criadora, Deus esteve inativo.
Negar que Deus seja eternamente necessário equivale a admitir que ele nem sempre o foi, que chegou a sê-lo, que começou o ser necessário e que antes de o ser não o era. Dizer que a criação proclama e testemunha a necessidade de Deus equivale a admitir, ao mesmo tempo, que, durante milhares e milhares de séculos, que seguramente precedeu a ação criadora, Deus era inútil.
Deus ocioso e preguiçoso! Deus inútil e supérfluo! Que triste postura para um ser essencialmente necessário.
É preciso, pois, confessar que Deus é de todo o tempo ativo e de todo o tempo necessário.
Mas então Deus não pôde criar, porque a ideia de criação implica, de maneira absoluta, a ideia de começo, de origem. Uma coisa que começou é porque nem sempre existiu. Existiu necessariamente num tempo em que, antes de o ser, não o era. E, curto ou longo, este tempo foi que precedeu a coisa criada; é impossível suprimi-lo, visto que, de todos os modos, ele existe.
Assim, temos de concluir:
a) Ou Deus foi eternamente ativo e eternamente necessário, e só chegou a sê-lo por causa da criação (e, se é assim, antes da criação faltavam a este Deus dois atributos: a atividade e a necessidade; este Deus era um Deus incompleto; era só um pedaço de Deus e mais nada, que teve necessidade de criar para chegar a ser ativo e necessário, e completar-se).
b) Ou Deus é eternamente ativo e eternamente necessário, e neste caso tem criado eternamente. A criação é eterna, e o Universo jamais começou — existiu em todos os tempos, é eterno como Deus, é o próprio Deus, com o qual se confunde. E, sendo assim, o Universo não teve princípio — não foi criado.
Em conclusão: No primeiro caso, Deus antes da criação não era ativo nem era necessário: era um Deus incompleto, quer dizer, imperfeito, e, portanto, não existia. No segundo caso, sendo Deus eternamente ativo e eternamente necessário, não pôde chegar a sê-lo, como não pôde criar.
É impossível sair daqui.